Em uma noite de outubro de 2013, diante de mil pessoas em uma suntuosa festa de casamento no Museu de Arte Moderna no Rio, o Ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Luiz Fux cantou uma música que havia composto em homenagem a noiva, a filha Marianna. A emoção do ministro da mais alta corte do país e sua demonstração de amor à filha impressionaram os convidados.
Meses depois, o pai passaria a jogar todas as fichas em outro sonho da filha: aos 33 anos, ela quer ser desembargadora no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
Mariana concorre a uma das vagas que cabem à OAB no chamado quinto constitucional- pela constituição, um quinto das vagas nos tribunais deve ser prenchido por advogados indicado pela OAB, e por representantes do Ministério Público.
A campanha do pai para emplacar a filha, materializada em ligações telefônicas a advogados e desembargadores responsáveis pela escolha, tem causado constrangimento no meio jurídico.
A situação levou a OAB a mudar o processo de escolha, com o objetivo de blindar-se de possíveis criticas de favorecimento à filha do ministro.
A vaga esta aberta desde julho, com a aposentadoria do desembargador Adilson Macabu. A disputa tem recorde de candidatos: 38.
Tradicionalmente, os candidatos tem os currículos analisados por cincos conselheiros da OAB. Quem comprova idoneidade e atuação em cinco procedimentos em ações na justiça, por ano, durante dez anos é sabatinado pelos 80 conselheiros da OAB. Por voto secreto, chega -se a seis nomes.
De uma nova sabatina com os conselheiros sai a lista com três nomes para a escolha final pelo governador.
Dessa vez, a OAB decidiu mudar o processo, que deve ser concluído no dia 9 de outubro. A pré-seleção dos currículos, feita em julho, foi anulada.
Agora, todos os conselheiros (inclusive os suplentes) vão fazer a triagem.
Os habilitados serão escolhidos por voto aberto.
” Estamos entre o mar e a rocha. Achamos melhor abrir o processo, e assim, todo mundo vê as informações sobre todos e faz a escolha”, disse um dos dirigentes da OAB.
A folha apurou que Fux procurou os conselheiros e desembargadores. De oito conselheiros ouvidos, quatro relataram que o ministro lembrou, durante as conversas, quais processos de que cuidavam poderiam chegar ao STF. Três desembargadores contaram que Fux os lembrou da candidatura de Marianna. Todos foram convidados para o casamento da filha.
As discussões tornaram tensas as sessões da OAB: ” Como ela [ Marianna Fux] vai entrar mesmo, é melhor indicar logo e acabar com isso”, disse o conselheiro Antonio Correa, durante uma sessão.
Procurado, Fux informou, por meio da assessoria, que não comentaria o caso.
EXPERIÊNCIA
Na disputa, Marianna enfrenta só uma concorrente com a mesma idade: Vanessa Palmares dos Santos, 33 anos. Os outros 36 candidatos têm idades entre 38 e 65 anos. Dois já foram finalistas da OAB em outras seleções, e metade tem mais de 20 anos de advocacia.
Marianna não havia passado pelo crivo inicial do conselho da OAB, por não ter anexados documentos comprovando a prática jurídica. Em vez disso, apresentou uma carta assinada por Sérgio Bermudes, amigo pessoal de Fux e ex-conselheiro da OAB. Marianna é sócia de seu escritório desde 2003.
Na carta, Bermudes declara que ela exerceu “continuamente, nesses mais de 10 anos, a atividade de consultoria e assessoria jurídica”. Com a recusa da carta, Marianna, então, anexou uma série de petições para comprovar a sua experiência.
A folha analisou o dossiê entregue por Marianna. Ela não conseguiu atender a exigência nos anos de 2007, 2008, 2009 e 2010. Mesmo assim, seu nome seguiu na seleção. A OAB alega que o regulamento deixa brechas para interpretações.
Marianna Fux não respondeu e-mails das reportagens nem recados deixados no escritório de Sérgio Bermudes.
Na próxima analise de currículos, um grupo de 20 advogados planeja impedir que a filha do ministro Fux siga no processo de seleção. O presidenta da OAB-RJ, Felipe Santa Cruz, não comentou o caso. [ DA FOLHA.COM]