Abuso de autoridade: Requião diz que sugestão de Moro é genérica; juiz contesta

O senador Roberto Requião e o juiz Sérgio Moro durante audiência no plenário do Senado (Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado)
O senador Roberto Requião e o juiz Sérgio Moro durante audiência no plenário do Senado (Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado)

O senador Roberto Requião (PMDB-PR), relator e defensor do projeto que endurece as punições para autoridades que cometem abuso, disse nesta segunda-feira (5), ao apresentar seu parecer final, que retirar a proposta da pauta de votações do Senado será uma “covardia brutal” da Casa.

Senadores contrários à proposta, casos de Ronaldo Caiado (DEM-GO) e Álvaro Dias (PV-PR) , preparam um requerimento para retirar a urgência do projeto, que acelera a tramitação da matéria. Se o requerimento for aprovado, o texto sairá da pauta de votações do plenário e voltará para análise da comissão que cuida do projeto.

Nesta segunda, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) aprovou documento em que manifesta “preocupação” com o projeto.

“Se o requerimento for aprovado, o projeto vai tramitar nas comissões e mostra uma covardia brutal do Senado em assumir uma posição clara a favor dos interesses da cidadania”, disse Requião.

O relatório final

No relatório final apresentado por Requião, a principal mudança foi o acolhimento parcial da sugestão do juiz federal Sérgio Moro, responsável pelos processos da Lava Jato na primeira instância, que fala sobre a não criminalização de divergências na interpretação das leis, conforme antecipou o Blog do Camarotti.

Na visão de Requião, a sugestão de Moro era genérica e, se aprovada, daria liberdade total para magistrados e procuradores cometerem excessos.

Neste domingo, milhares de manifestantes saíram às ruas de pelo menos dez estados e do Distrito Federal em defesa da Operação Lava Jato e contra projetos sobre abuso de autoridade, caso do texto em análise pelo Senado e do pacote anticorrupção aprovado com várias modificações pela Câmara.

Moro contesta

O juiz Sérgio Moro classificou o texto como um avanço em relação ao anterior, mas considerou que o relator não acolheu a sugestão dele, de que não configura crime de abuso de autoridade a divergência na interpretação da lei penal ou na avaliação de fatos e provas.

Moro também afirmou que a redação do artigo sobre o assunto é confusa e que, aparentemente, o magistrado será obrigado à interpretação literal da lei, o que do ponto de vista do direito, que comporta várias interpretações, não é correto. Ainda segundo Moro, não há como o legislador restringir o juiz a um método de interpretação.

O texto enviado por Moro dizia: “Não configura crime previsto nesta lei a divergência na interpretação da lei penal ou processual penal ou na avaliação de fatos e provas”.

Requião mudou a redação do texto sugerido pelo juiz e fez acréscimos ao item.

“Não constitui crime de abuso de autoridade o ato amparado em interpretação precedente ou jurisprudência divergentes, bem assim o praticado de acordo com avaliação aceitável e razoável de fatos e circunstâncias determinantes, desde que, em qualquer caso, não contrarie a literalidade desta lei [sobre abuso de autoridade]”, diz o parágrafo acrescentado ao projeto original por Requião.

Requião disse que a redação que propôs “conserta” a sugestão feita por Moro.

“Quando houver uma jurisprudência anterior e não for literalmente contra o texto da lei, não se pode criminalizar o juiz por isso. Acaba com a possibilidade de qualquer habeas corpus contra uma sentença de primeiro grau vir a criminalizar o juiz. Isso seria uma bobagem”, explicou o senador.

“O que ele [Moro] queria era o seguinte: ‘Tudo que vocês lerem nesta lei não vale mais nada porque o juiz pode fazer o que quiser’ […] Ele não queria salvaguarda. Ele queria a eliminação do projeto de abuso de autoridade”, completou Requião.

Pelo relatório, são autoridades os membros dos poderes Legislativo, Judiciário, Ministério Público, servidores públicos e militares e membros dos tribunais ou conselhos de contas.

Mais mudanças

O relator também apresentou outras alterações em relação ao projeto original, protocolado pelo senador investigado na Lava Jato Renan Calheiros (PMDB-AL):

>> Alterou o texto original para aumentar a punição para a autoridade que “divulgar gravação” sem relação com a prova que se pretendia produzir, “expondo a intimidade ou a vida privada, ou ferindo a honra e a intimidade” do acusado ou do investigado no processo. A pena prevista originalmente era detenção de 6 meses a 2 anos, além de multa. Com a modificação, passa a ser de 1 a 4 anos de detenção e pagamento de multa.

>> Aumentou a punição para quem realiza interceptações ou escutas sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei. A pena inicialmente prevista era de detenção de 1 a 4 anos. Passou para reclusão de 2 a 4 anos e multa.

>> Punição de 1 a 5 anos de detenção para a autoridade que iniciar processo penal “com abuso de autoridade”.

>> Punição para a autoridade que estende a investigação sem justificativa e em “prejuízo do investigado”. Detenção de 6 meses a 2 anos de multa.

>> Detenção de 1 a 4 anos e multa para quem decretar, em processo judicial, a indisponibilidade de ativos financeiros em quantia que extrapole exacerbadamente o valor estimado para a satisfação da dívida da parte.
Outros pontos

>>Pena de 1 a 4 anos de detenção, além do pagamento de multa, para delegados estaduais e federais, promotores, juízes, desembargadores e ministros de tribunais superiores que ordenarem ou executarem “captura, prisão ou busca e apreensão de pessoa que não esteja em situação de flagrante delito ou sem ordem escrita de autoridade judiciária”.

>> A proposta estabelece ainda pena de detenção de 1 a 4 anos para a autoridade policial que constranger o preso, com violência ou ameaças, para que ele produza provas contra si mesmo ou contra terceiros.

>> Invadir, entrar ou permanecer em casas de suspeitos sem a devida autorização judicial e fora das condições estabelecidas em lei (pena de detenção de 1 a 4 anos);

>> Obter provas, durante investigações, por meios ilícitos (pena de detenção de 1 a 4 anos);

>> Não fornecer cópias das investigações à defesa do investigado (pena de detenção 6 meses a 2 anos).

‘Oportunidade’

Questionado sobre se o atual momento é adequado para a votação do projeto, Roberto Requião afirmou que “a crise é sempre uma oportunidade” e que deve ser aproveitada para se fazer uma legislação “melhor”.

O parlamentar pediu que o projeto que relata não seja confundido com o pacote do Ministério Público aprovado pela Câmara de forma desfigurada. Para ele, o projeto das dez medidas de combate à corrupção era “autoritário” e uma “bobagem absoluta”.

Fonte: G1

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